Musk, Congresso, Justiça: bolsonaristas adotam tática da ‘enxurrada’ de Trump em ofensiva contra Moraes nos EUA

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    Crédito, SAMUEL CORUM/POOL/EPA-EFE/REX/Shutterstock & ReutersLegenda da foto, Trump chama Eduardo Bolsonaro de “amigo” durante discurso em conferência conservadora em Washington Article informationDesde a posse de Donald Trump como o novo presidente dos Estados Unidos, há 35 dias, o deputado federal Eduardo Bolsonaro já fez três viagens ao país em uma campanha de apoio ao ex-presidente Jair Bolsonaro e de ofensiva contra o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, que acusa de agir politicamente motivado contra seu pai.E a próxima visita ao país, a quarta desde a posse, ocorrerá semana que vem. “Vou pular carnaval nos EUA”, diz Eduardo à BBC News Brasil, se esquivando de contar os motivos da nova viagem.Em suas andanças na capital americana Washington, Eduardo se encontrou com quase uma dezena de parlamentares, integrantes do Executivo e expoentes da direita do país, como o ideólogo Steve Bannon, em uma estratégia que prevê múltiplas frentes de ação. Se tem os trunfos de obter muitos acessos, Eduardo, porém, ainda não conseguiu o embarque da Casa Branca à sua estratégia.”Eu não peço sanção ao povo brasileiro, nada sobre tarifas (comerciais). Mas no caso do Alexandre de Moraes, acho que ele se enquadra para sofrer ‘sanções OFAC’, como aconteceu com o pessoal do Tribunal Penal Internacional (TPI)”, explicou Eduardo Bolsonaro à BBC News Brasil, mencionando as sanções econômicas e de viagem impostas a promotores do TPI pelo presidente Trump. OFAC é a sigla em inglês para Escritório de Controle de Propriedades Estrangeiras, órgão responsável por impor esse tipo de punição a estrangeiros e ligado ao Departamento de Tesouro dos EUA.”Você acha que o Trump vai deixar que o Brasil copie a Venezuela e mantenha inelegível um dos principais opositores de um governo de esquerda?”, questiona Eduardo, sem explicar de que maneira Trump poderia reabilitar Bolsonaro na urna eletrônica em 2026, já que o ex-presidente está inelegível até 2030 por decisão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Alexandre de Moraes nega qualquer decisão política e afirma, em declarações recentes e nos autos, que tem atuado para proteger a legislação e a democracia brasileiras. Procurado pela BBC News Brasil, ele não quis comentar o assunto.Ex-sócio de Trump em um empreendimento hoteleiro no Rio de Janeiro, o ex-comentarista da Jovem Pan Paulo Figueiredo é um dos artífices da estratégia política do grupo de Bolsonaro nos EUA. As ações têm seguido a cartilha dos próprios trumpistas de “flood the zone”, algo como promover uma “enxurrada” de atos simultâneos para dificultar a resistência dos oponentes. Radicado na Flórida, Figueiredo costuma acompanhar Eduardo em boa parte das agendas políticas.”Virá de todos os lados: (Elon) Musk, Senado (dos EUA), Câmara (dos EUA), Judiciário (dos EUA). E por fim a Casa Branca vai agir”, afirma Figueiredo, denunciado pela Procuradoria Geral da República por envolvimento em atos golpistas, o que ele nega.Crédito, ReutersLegenda da foto, Alexandre de Moraes é alvo de ofensiva de bolsonaristas em diferentes frentes nos EUAEnxurradaO processo foi iniciado apenas algumas horas depois da denúncia da PGR apontar Bolsonaro como suposto líder de uma organização criminosa que teria planejado a ruptura democrática do Brasil após as eleições de 2022. O advogado da empresa de Trump, Martin de Luca, tem atuado também como conselheiro de Bolsonaro, de acordo com o jornal New York Times. Em um revés para a Rumble e a empresa de Trump, o pedido de liminar para barrar qualquer ação de Moraes contra ambas foi negado pelas duas empresas nesta terça, 25/1. O mérito da ação ainda não foi julgado.Mas não parou aí. Na próxima quarta-feira, 26/2, o Comitê Judiciário da Câmara dos Representantes dos EUA avaliará um projeto de lei batizado de ”No Censors on our Shores Act”, ou algo como “Lei Sem Censores dentro de nossas Fronteiras”.O projeto, que prevê a deportação e inadmissibilidade em território americano de autoridades estrangeiras que tenham infringido a Primeira Emenda da Constituição dos EUA sobre liberdade de expressão, foi proposta inicialmente no fim do ano passado tendo como alvo, em particular, Alexandre de Moraes. À época, Moraes havia bloqueado em território brasileiro o X, antigo Twitter, do bilionário trumpista Elon Musk no Brasil, depois que o empresário se recusou a cumprir ordens da Corte e estabelecer representantes legais no país. Mais tarde, Musk recuou.”O juiz do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes é a vanguarda de um ataque internacional à liberdade de expressão contra cidadãos americanos como Elon Musk”, afirmou à BBC News Brasil a congressista Maria Elvira Salazar, uma das entusiastas do projeto de lei que mira Moraes, nesta terça (25/2). Segundo Salazar, “os aplicadores da censura não são bem-vindos na terra da liberdade, os Estados Unidos.”Salazar, republicana da Flórida, foi uma das que recebeu visita de Eduardo Bolsonaro e de Paulo Figueiredo na capital americana na última semana. Outro deputado visitado pelo brasileiro foi Jim Jordan, presidente da Comissão de Justiça da Câmara, de quem Eduardo ouviu que o projeto deve ser aprovado com facilidade na Comissão e de lá seguir ao Plenário, onde os republicanos têm uma diminuta maioria.Eduardo esteve ainda, na semana passada, no gabinete do deputado republicano Rich McCormich, da Geórgia, que na noite desta segunda (24/2) marcou o presidente dos EUA em um post no X em que acusava Moraes de estar “usando o judiciário como arma para fraudar as eleições de 2026, silenciando a oposição e protegendo o presidente Lula”. Bolsonaro está inelegível até 2030 por decisão do colegiado do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).McCormich dizia ainda que “a denúncia (da PGR) a Jair Bolsonaro não é justiça – é perseguição política, tal como o que foi feito ao Presidente Trump” e chamava Moraes de “ameaça aos EUA”. “Exorto a administração Trump e o Congresso a imporem sanções Magnitsky, proibições de vistos e sanções econômicas. Os EUA devem defender a democracia, a liberdade de expressão e o Estado de direito – antes que seja tarde demais”. Sanções Magnitsky, criadas em 2012, preveem que o alvo está proibido de entrar nos EUA ou usar seu sistema bancário. Segundo Eduardo, McCormich e os demais deputados, como o republicano Chris Smith, enviarão essa semana cartas individuais ao National Security Council da Casa Branca pedindo sanções a Moraes.Pouco depois da postagem de McCormich, o senador republicano Mike Lee, também visitado nos últimos dias por Eduardo e Figueiredo, repostou a mensagem do colega de partido, repetiu acusações sem provas de que Alexandre de Moraes usou a justiça eleitoral politicamente e anunciou que fará uma viagem ao Brasil ainda este ano com uma delegação de senadores para “fazer algumas perguntas difíceis sobre o juiz Alexandre de Moraes e o alegado uso político do sistema judicial brasileiro”.Ato contínuo, Musk entrou no fio comentando: “Bom”. Ele também interagiu com uma postagem em inglês de um influencer que relatava trechos de um discurso de Moraes na Faculdade de Direito da USP nesta segunda, 24/2, na qual o ministro citou as big techs e afirmou que “estamos começando a entender como se deu esse processo de transformar as redes sociais em instrumentos de uma ideologia nefasta, o fascismo, disseminando discursos de ódio, misoginia, homofobia e até ideias nazistas”.Em comentário à postagem, Musk pergunta: “Moraes não tem propriedades nos EUA?” Na sequência, Paulo Figueiredo responde dizendo que não era preciso que o ministro brasileiro tivesse qualquer propriedade no país para que fosse alvo de sanções desde que fosse incluído na Specially Designated Nationals (SDN) list, uma lista de indivíduos e entidades alvos de sanção dos EUA, o que potencialmente congelaria ativos e transações feitas com instituições financeiras que se relacionam com os EUA. É um instrumento frequentemente usado contra figuras de regimes adversários dos EUA, como o russo e o chinês. Musk, então respondeu: “interessante”.”Eu não sei se o Alexandre de Moraes ficou mal acostumado a trocar farpas com Elon Musk quando ele era só um empresário, mas agora ele é praticamente ministro do governo Trump, a situação é diferente”, diz Eduardo.Crédito, ReutersLegenda da foto, O bilionário Elon Musk e o presidente argentino Javier Milei: ambos em ofensiva contra MoraesSem a caneta de TrumpMas até agora Donald Trump não usou a Casa Branca ou departamentos do governo americano para promover Bolsonaro ou punir Moraes.Apoiadores do ex-presidente nutriam a expectativa de que o ministro brasileiro tivesse o visto americano cassado por Ordem Executiva de Trump assinada ainda no dia da posse, 20/1. A esperança se baseava no fato de que o nomeado do Republicano para o Departamento de Estado, o então senador Marco Rubio, havia endossado esse tipo de ideia no ano passado.Mas Trump não agiu. À época, um alto conselheiro de Trump disse à BBC News Brasil que o republicano estava focado nas questões prioritárias de seu próprio país – o que não parece ter mudado pouco mais de um mês depois.E apesar de reiterados pedidos, Eduardo ainda não obteve uma reunião com o secretário de Estado Rubio. Na semana passada, a BBC News Brasil apurou que ele foi recebido no Departamento de Estado pelo Embaixador Michael Kozak, um alto funcionário do Escritório de Assuntos Ocidentais do Departamento.A reunião, que não foi divulgada pelo Departamento de Estado nem pelo deputado, levou Eduardo a alterar, de última hora, o horário de seu discurso no Cpac, a conferência conservadora que projetou Trump e cuja edição de 2025 aconteceu em Washington, na última semana. Quando falou, Eduardo defendeu que Jair Bolsonaro tem sido vítima da politização do Judiciário, encarnado por Alexandre de Moraes, e comparou a situação com a atuação de juízes americanos que têm bloqueado Ordens Executivas de Trump potencialmente inconstitucionais. Foi aplaudido.O clima no evento era francamente favorável aos Bolsonaro. Pelos corredores, Bannon se recusou a responder perguntas e se limitou a dizer à BBC News Brasil, em inglês: “Bolsonaro Livre”. Já um influencer de direita que recém entrevistou Bolsonaro no Brasil arrancou vaias a Moraes e impressionou a plateia ao descrever sua visita ao Brasil como a um lugar perigoso, pro qual ele foi tendo “um advogado internacional contratado”, “um veículo blindado” e “uma equipe de nove pessoas”, por segurança. Já o presidente argentino Javier Milei citou de passagem “fraudes eleitorais no Brasil”, sem explicar ao que se referia.No último dia do evento, Eduardo, que não se encontrou com Trump privadamente desde a posse apesar das três visitas recentes, posicionou-se nas fileiras da frente e foi a última autoridade estrangeira a ser citada pelo republicano em seu discurso. Trump o chamou de “meu amigo”, elogiou a família e mandou “um oi” a seu pai, o ex-presidente. Não fez, porém, qualquer menção à denúncia da PGR ou aos problemas de Bolsonaro na Justiça.Questionado sobre o assunto, Eduardo relembrou o convite a seu pai para participar da posse de Trump (Bolsonaro não teve a viagem autorizada pelo STF) como mostra de ação do presidente americano e contemporizou:”O Trump tem que entender tudo direitinho primeiro. E é normal que o governo aja silenciosamente”.São sinais que têm sido observados com atenção pelo governo brasileiro.A BBC News Brasil apurou que o Itamaraty monitora os acontecimentos, mas não vê, até agora, razões para se posicionar pública e oficialmente. Um embaixador com conhecimento das relações com os americanos afirmou que “em todas as ocasiões” os diplomatas do Brasil repetem sobre a importância do STF na defesa da democracia do Brasil.Em termos práticos, até agora Trump prometeu tarifas sobre o aço, o alumínio e o etanol brasileiros. Embora evite conversas que peçam sanções econômicas ao Brasil – o que tem sido feito por outros bolsonaristas – Eduardo Bolsonaro diz não ter feito movimentos para tentar aliviar o risco a esses setores produtivos.”Isso é (um assunto) de relação governo a governo. Quem tem que consertar isso é o Lula e seus ministros”, afirmou Eduardo, relembrando que seu pai também teve que negociar tarifas com Trump e criticando o que chamou de “falta de canal” entre o atual Planalto e a Casa Branca.Dentro da gestão Lula, a Advocacia Geral da União (AGU) chegou a adotar uma postura pró-ativa para defender o ministro, o que mudou nos últimos dias. Agora, a ordem é esperar que o ministro peça formalmente para ser defendido pelo órgão. Alexandre de Moraes ainda não foi citado no processo nos EUA e tampouco teve defesa constituída para o processo na Flórida. Procurado via STF, o ministro não quis comentar a ofensiva a ele nos EUA.



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