Partido governista boicota, e presidente da Coreia do Sul escapa de impeachment após decretar lei marcial

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Em uma manobra para evitar a deposição do presidente da Coreia do Sul, Yoon Suk-yeol, deputados do governista Partido do Poder Popular (PPP) abandonaram a sessão convocada neste sábado para votar o impeachment do mandatário, que decretou lei marcial no começo da semana — uma medida que abalou as estruturas políticas de uma das principais democracias da Ásia. Sem quórum, a votação não pode ocorrer, e Yoon escapou do impeachment.

A manobra aconteceu por volta das 06h (em Brasília), pouco depois da abertura da sessão, quando os deputados governistas já posicionados dentro da Assembleia Nacional abandonaram a sessão. De um total de 108 deputados, apenas um permaneceu para votar — Ahn Cheol-soo, que já concorreu à Presidência.

Para que o presidente fosse afastado, eram necessários que 200 dos 300 deputados votassem a favor da moção. Com uma bancada de 192 deputados, a oposição liderada pelo Partido Democrático, que propôs o impeachment, precisava que oito governistas votassem contra o presidente — algo que parecia encaminhado até a véspera da votação.

O boicote dos governistas enfureceu uma multidão de cerca de 150 mil sul-coreanos reunidos no entorno da Assembleia Nacional, que pediam pelo impeachment do presidente. Os manifestantes chamaram os parlamentares que se recusaram a votar de “traidores” e gritaram palavras de ordem, pedindo a prisão de Yoon e exigindo que os deputados voltassem ao plenário. Dentro da Assembleia, deputados da oposição discursaram tentando convencê-los a participar da votação.

Em meio à pressão, três parlamentares oposicionistas voltaram, provocando reação de entusiasmo nos manifestantes. Ao menos um deles, Kim Sang-wook, afirmou que retornou apenas para depositar o seu voto contrário ao impeachment, de modo que ainda seriam necessárias ao menos seis deserções para que a moção de afastamento fosse aprovada.

A base governista no Legislativo parecia ter se decidido por votar pelo impeachment no dia anterior, até que o presidente apareceu em público, horas antes da votação, para um pronunciamento nacional, o primeiro desde a imposição da lei marcial. Yoon se desculpou pela medida, que descreveu como uma “tentativa desesperada”.

Multidão realiza protesto diante da Assembleia Nacional da Coreia do Sul, em Seul — Foto: Philip FONG / AFP
Multidão realiza protesto diante da Assembleia Nacional da Coreia do Sul, em Seul — Foto: Philip FONG / AFP

— Sinto muito e peço sinceras desculpas aos cidadãos, que se sentiram muito angustiados. — disse Yoon. — A medida nasceu do desespero do presidente, que é o responsável final pelos assuntos de Estado, mas que no processo causou ansiedade e transtorno para o povo.

Ele negou a informação de que faria uma nova declaração de lei marcial, referindo-se a rumores que circulam desde a quinta-feira no meio político sul-coreano. Acrescentou também que não fugiria da “responsabilidade legal e política” pela declaração da lei marcial, e que deixaria a estabilidade política na mão do seu partido.

Embora o líder do partido, Han Dong-hoon, tenha afirmado que a queda do presidente seria inevitável, o discurso parece ter ressoado entre as fileiras do PPP. Em uma entrevista à rede britânica BBC, o parlamentar Cho Kyung-tae, que anunciou publicamente que votaria a favor do impeachment, disse que voltou atrás após o pedido de desculpas de Yoon.

Park Chan-dae, outra liderança oposicionista, disse que se a moção não passasse, ele iria “imediatamente apresentá-la na sessão extraordinária da Assembleia Nacional”. Uma nova votação pode acontecer tão cedo quanto 11 de dezembro.

Pelas regras, se o impeachment for aprovado, Yoon seria imediatamente afastado e o primeiro-ministro, Han Duck-soo, assumiria o cargo de forma interina. Logo em seguida, a decisão seria levada à Corte Constiticional, onde seis dos nove ministros precisariam confirmá-la para selar o afastamento — como a moção não foi aprovada, a Assembleia poderá repetir a votação.

Caso fosse confirmada a derrota, Yoon Suk-yeol se tornaria o terceiro presidente a sofrer impeachment no século XXI. Segundo uma pesquisa do instituto Realmeter, 73,6% dos sul-coreanos defendem sua saída do cargo.

Eleito com uma vantagem de menos de um ponto percentual em 2022, Yoon Suk-yeol se tornou um dos mais impopulares presidentes da História recente da Coreia do Sul, com índices que raramente superavam os 30%. Seu governo mesclou atos populistas — como a saída da Casa Azul, a antiga sede da Presidência, sob pretexto de economia de gastos — com uma condução errática de políticas públicas e, especialmente, da economia. Os altos preços dos imóveis, um fator que contribuiu para sua vitória, persistiram, erodindo o apoio em uma parcela dos sul-coreanos que o apoiaram na campanha.

A postura de enfrentamento com a Coreia do Norte, acompanhada por ameaças de conflito militar com um vizinho que tem armas nucleares, não recebeu grande apoio, e os escândalos em série, inclusive envolvendo a primeira-dama, pareciam pavimentar seu mandato para um fim antecipado, ainda mais com um Parlamento de oposição.

Sob pressão, Yoon usou um mecanismo que não era invocado desde a ditadura militar, no final dos anos 1970, a lei marcial, citando uma suposta ameaça norte-coreana mas, na verdade, se referindo às dificuldades enfrentadas para aprovar projetos e manter no cargo seus ministros — em fevereiro, Lee Sang-min, titular da pasta do Interior, sofreu impeachment, mas ficou no governo após uma decisão judicial. A pressão sobre seu Gabinete foi citada no discurso de terça-feira, quando anunciou a lei marcial.

Sob ordens do presidente, tropas cercaram o Parlamento, mas não impediram que 190 deputados, incluindo do partido de Yoon, derrubassem a lei marcial, dando início a uma discussão sobre sua permanência no cargo, cada vez mais ameaçada. Inicialmente, sua sigla, o Partido do Poder Popular, disse que votaria contra o pedido de impeachment apresentado pela oposição, mas nesta sexta-feira as lideranças partidárias mudaram de ideia. Em entrevista, Han Dong-hoon disse que a decisão se devia a informações de que Yoon ordenou a prisão de políticos durante a lei marcial, inclusive a dele.

— À luz dessas novas revelações, cheguei à conclusão de que é necessário suspender o presidente Yoon de exercer seu mandato para proteger a Coreia do Sul e seu povo — disse Han, afirmando ainda que Yoon “não estava reconhecendo seus erros”. — [Se Yoon continuar no cargo] temo que haverá um grande risco de ações radicais como esse estado de emergência se repetirem, e ele colocará a Coreia do Sul e seu povo em grande perigo.

Lee Jae-myung, derrotado por Yoon em 2022 e que também estava na lista de políticos que deveriam ser presos pelas tropas, afirmou que a democracia na Coreia do Sul está “em seu momento mais crítico”, e defende que o presidente seja investigado por seus crimes, inclusive por alta traição, um delito que pode levar à pena de morte (suspensa no país desde 1997).

— A Coreia do Sul está em crise devido ao “conflito interno de Yoon Suk-yeol” — disse Lee nesta sexta-feira a jornalistas. — Yoon é um gênio do crime.



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