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A conclusمo é que o impacto da preservaçمo das TIs vai além do meio ambiente, destacando-se como peça-chave para a segurança hيdrica, alimentar e econômica do Brasil. O estudo foi feito por um grupo de pesquisa em ecologia tropical do Instituto Serrapilheira, a partir do cruzamento e anلlise de diversos dados, como os do MapBiomas, IBGE e Funai.
Os dados indicam que 18 estados e o Distrito Federal encontram-se parcial ou totalmente dentro da لrea de influência dessas Terras Indيgenas (TIs) amazônicas. Em estados como o Acre, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul e Paranل, hل regiُes onde a chuva proveniente da reciclagem de لgua feita pelas florestas das TIs amazônicas chega a um terço do total anual de cada local. Até 30% da chuva média que cai sobre as terras agropecuلrias do paيs estل diretamente relacionada à eficiente reciclagem de لgua nesses territَrios.
A agricultura e a pecuلria estمo entre as atividades que mais consomem لgua no Brasil. Ou seja: a chuva é condiçمo fundamental para essas atividades. “O desmatamento e a degradaçمo das florestas nas Terras Indيgenas causam a reduçمo das chuvas e, com isso, acarretam riscos graves à economia do paيs”, afirma o hidrَlogo Caio Mattos, pesquisador de pَs-doutorado na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e autor do estudo. “A conservaçمo dessas florestas é crucial para garantir a cadeia produtiva do setor agropecuلrio e, portanto, a produçمo de uma significativa parcela da economia nacional.”
Apesar disso, Rondônia e Mato Grosso, que figuram entre os nove estados mais influenciados por essa chuva, estمo entre os que mais desmataram florestas desde 1985. Os dados mostraram, ainda, que as chuvas provenientes dessas TIs contribuem diretamente para a segurança alimentar nacional: a participaçمo da agricultura familiar no valor da produçمo total supera os 50% em vلrios estados influenciados, e grande parte da produçمo desses pequenos produtores é destinada, justamente, ao mercado interno.
Como Terras Indيgenas da Amazônia “irrigam” grande parte do paيs
Na prلtica, a Amazônia “irriga” grande parte do paيs por meio dos chamados “rios voadores”: a umidade reciclada nas florestas das Terras Indيgenas amazônicas é transportada pela atmosfera e se torna chuva em outras regiُes do Brasil, como o Centro-Oeste e o Sul. Esse mecanismo natural de geraçمo de chuva depende da manutençمo de لreas de florestas nativas conservadas, que sمo responsلveis pelo bombeamento de umidade para a atmosfera.
“A influência dos rios voadores jل era conhecida, entمo o que fizemos foi usar dados jل disponيveis desde 2020 para quantificar de fato essa influência – nمo sَ do ponto de vista da لgua, mas também da economia, em uma abordagem interdisciplinar”, explica a matemلtica e meteorologista Marina Hirota, professora na UFSC. “Ou seja, mais do que mapearmos as chuvas que atingem as لreas de agropecuلria, convertemos esse dado em valores econômicos.”
As TIs ocupam aproximadamente 23% da Amazônia Legal, incluem mais de 450 territَrios e abrigam cerca de 403,6 mil pessoas. Elas atuam como barreira ao desmatamento ao longo da histَria: dos 4,4 milhُes de hectares desmatados no bioma Amazônia entre 2019 e 2023, apenas 3% (130,2 mil hectares) ocorreram dentro de TIs.
Isso acontece porque grande parte das atividades desenvolvidas em TIs sمo realizadas de maneira integrada ao ecossistema, envolvendo formas de uso e manejo que nمo necessariamente implicam na remoçمo da vegetaçمo nativa. Existe, assim, relaçمo intrيnseca entre a proteçمo territorial de povos indيgenas e a conservaçمo de ecossistemas.
A demarcaçمo de Terras Indيgenas tem pautado o debate pْblico porque o Supremo Tribunal Federal (STF) discute, nesse momento, a constitucionalidade da lei do marco temporal (lei 14.701/2023). A tese do marco temporal prevê que os povos indيgenas teriam direito de ocupar apenas as terras que jل ocupavam ou disputavam na data da promulgaçمo da Constituiçمo de 1988. “Os dados que analisamos endossam estudos anteriores. Eles mostram que a proteçمo e a demarcaçمo das Terras Indيgenas sمo instrumentos fundamentais e urgentes para a conservaçمo da Amazônia”, completa Caio Mattos.
Além de Hirota e Mattos, assinam a nota técnica os cientistas Paulo N. Bernardino, Bruna Stein, Gabriela Prestes Carneiro, Julia Tavares, Adriane Esquivel-Muelbert, Silvio Barreto, André Braga Junqueira e Arie Staal. O estudo foi desenvolvido no escopo de um grupo de pesquisa em ecologia tropical do Serrapilheira – Staal, holandês, é o ْnico dos 10 autores que nمo é integrante do grupo.
Constituيdo no inيcio de 2024, o grupo transdisciplinar inclui pesquisadores brasileiros de hidrologia, biodiversidade, ecologia, ecologia humana, matemلtica, clima, arqueologia, antropologia, polيticas pْblicas, economia e comunicaçمo. “A junçمo de cientistas com expertises diferentes permitiu essa anلlise complexa de dados que nمo sمo fلceis de se obter”, explica Hugo Aguilaniu, diretor-presidente do Serrapilheira. “ة uma ciência sofisticada, que traz uma leitura mais completa do impacto das Terras Indيgenas na economia.”
Os autores também sمo vinculados à UFSC, Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Universidade de Utrecht (Holanda), Universidade de Uppsala (Suécia), Cary Institute of Ecosystem Studies (EUA), Museu Nacional de Histَria Natural (França) e Universidade de Birmingham (Reino Unido).
A nota técnica é endossada por outros nomes de peso da ciência: o climatَlogo Carlos Nobre, o fيsico Paulo Artaxo, a antropَloga Manuela Carneiro da Cunha (os três da USP), o economista Ronaldo Seroa da Motta (Uerj) e a biَloga Mercedes Bustamante (UnB).